terça-feira, 22 de setembro de 2009

Burrocracia

(Nota prévia - pedimos licença aos donos do poder. Precisamos demais desabafar).

Quanta burrocracia... A pergunta é: qual a motivação pra tanta burrice? As “Vossas Excelências” que estão sentadas em confortáveis cadeiras por aí parecem usar algum tipo de venda que as impeça de ver a realidade.

Nos últimos dias constatamos alguns fatos que nos fazem desacreditar (ainda mais) que a justiça no Brasil seja realmente... efetiva (quase dissemos "justa", mas a palavra é meio forte - afinal, como já disse o Saramago, em outro contexto, "nada há que seja verdadeiramente livre nem suficientemente democrático").

Um nobre magistrado – desses tantos competentes que temos – parou um processo porque o nome do autor estava escrito errado na sua certidão de casamento. Por uma letra. Detalhe: na certidão havia o número do RG e do CPF do autor – o que permitia facilmente que ele, ilustríssimo , constatasse que se tratava da mesma pessoa. Ah! Mas sem problemas... afinal de contas o cara pode ficar esperando por tempo indeterminado até resolvermos essa picuinha. Além disso, "segurança jurídica" nunca é demais - pensem, o cara poderia estar tentando divorciar outra pessoa (talvez um rival romântico, quase homônimo).

Quem dera esse mesmo excesso de zelo fosse adotado em investigações policiais ou no exame de títulos de propriedade grilados (ops, deliramos, perdões).

Em outro processo, um outro nobre julgador despachou afirmando que somente concederia Justiça Gratuita se o advogado do processo assinasse uma declaração na qual constasse que trabalharia de graça... Pois é... faltou alguém dizer para esse magistrado tão sábio que muita, mas muita gente mesmo, deixa de exercer seus direitos de acesso a Justiça devido às altas custas processuais (e no Paraná, elas são as mais altas). Azar. Se pagar, anda. Quem não paga, espera. É como a fila do SUS em certas localidades (só que, nesse caso, a discriminação é ilegal. Ponto pra Reforma Sanitária, zero pra nós, raposas engomadas e elefantes brancos).

E olha que a gente às vezes até trabalha de graça - mas não no que Vossa Excelência quer, e isso talvez incomode. Por isso Vossa Excelência quer que a gente viva de vento, enquanto o cliente vê navios. Paisagem um tanto poética - talvez ainda mais pra quem ganhe uns tantos paus por mês.

Os poucos e bons que nos perdoem. Não nos passa pela cabeça sermos juízes – talvez porque gostemos de ver "as coisas funcionarem" e talvez porque acreditemos que a justiça deva ser realmente justa. Mas - já disseram até sábios do ocidente - o que existe para não funcionar, sendo disfuncional, funciona, e ademais é justo dizer que a justiça, justamente ela, é também uma coisa relativa (já se disse que houve "guerras justas")

Acreditamos que juízes, em suas provas concursais, sejam também avaliados por quanto tempo conseguem atravancar um processo. Celeridade processual então... nem pensar!

Ah, se fôssemos contar todas as histórias de juízes iguais a esses, para os quais tivemos o desprazer de peticionar. Seriam páginas e páginas de histórias inacreditáveis. Os fóruns e tribunais, não poucas vezes, se transfiguram em verdadeiros circos de horrores. E estamos a mercê de pessoas que parecem ter se formado por correspondência na Faculdade da Injustiça.

Pensando bem, do jeito que a coisa anda, talvez tenha cusinho pra isso também. Telepresencial, é claro.

De repente falte o que fazer nos fóruns, as cadeiras já não sejam tão confortáveis, talvez ainda tenham cortado os jogos do computador, ou quem sabe ganhar dez contos por mês tenha tornado a vida dos ilustríssimos um tanto quanto monótona... Bom, se o problema for falta do que fazer, poderão ir lá em minha casa dar uma lavada nas janelas – afinal de contas, para mim, mera trabalhadora, pagar um profissional que faça a minha faxina já está saindo um pouco caro para o meu baixo orçamento.


Pelo menos lavando janelas, o único erro idiota que cometerão será deixá-las com manchas...

***
(A)MORAL DA HISTÓRIA

Um dia, os juízes serão sérios, os processos farão sentido e Kafka se mostrará errado.
Ou não.

Por Ana Cristina Rivelles e Juliano Torres

sexta-feira, 15 de maio de 2009

De quem são as ruas?

Decisões de orientação fascista (com fundamentos, no mínimo, frágeis e contrários a Constituição Brasileira) levaram à proibição da marcha da maconha, em nove cidades – Cuiabá, Curitiba, Brasília, Belo Horizonte, Fortaleza, João Pessoa, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.

“Diante dessa decisão judicial, se as pessoas insistirem, essa conduta vai caracterizar um crime de desobediência, essas pessoas terão que ser conduzidas para a delegacia, não seria uma outra ação, seria uma ação policial” – promotora de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Maria Elda Fernandes Melo. 

"Polícia para quem precisa de polícia" – Arnaldo Antunes (Grifos nossos)

Neste cenário, o mês de Maio, ao contrário do que a nossa mitologia coletiva lembra ter acontecido há 41 anos atrás, foi tempo de uns dias tristes na História daquelas tais liberdades, conquistadas tão a ferro e a fogo - e ainda tão poucas quanto o pão, para muitos.

É importante frisar que esta discussão não engloba o uso ou não da maconha. Justamente por este motivo é que a questão é mais delicada do que parece. O fato do uso de maconha ser proibido em nosso país não impede que qualquer pessoa – ou muitas pessoas, todas ao mesmo tempo – questionem e discutam sobre o assunto.

Primeiramente a decisão fere o art. 5º, IX da CF:
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

E isso deveria ser o bastante.

A decisão faz parecer que na marcha as pessoas iriam fumar maconha como se não fosse proibida. Talvez o que falte seja esclarecer que não se trata de um advento de “neo-woodstock” e nem se trata (felizmente ou não) de um ato anarquista, como afirmou o magistrado Pedro Luís Sanson Corat. E se o fosse, também não é livre a opção política?

Vedar a liberdade de expressão e retroceder à ditadura (pura e dura) não parece a melhor solução para o conflito – e nem deve ser ou parecer. A marcha pela legalização da maconha pode ser comparada à "Parada Gay", na qual as pessoas tão somente mostram e expõem suas opiniões e seus modos de ser; na primeira coloca-se em discussão se a maconha deve ou não ser legalizada e, na segunda, homossexuais expõem seu desejo de amar livremente. Será que em alguma das manifestações existem características anarquistas? E para tanto, pensa-se em colocar a polícia com seus cavalos perseguindo manifestantes, ou previamente, barrar direitos já (ao menos teoricamente) conquistados?

Sublinhe-se, expressar desejos, vontades e questionamentos e “comer criancinhas” são coisas completamente diferentes.

Já não se discute tanto, já não se pensa tanto, já não se fala de quase nada que possa alterar a gramática de outros ditos – e a tal da "esfera pública" se parece cada vez mais com um videogame antigo, os mesmos personagens e as mesmas ações repetindo-se nos mesmos cenários – e, não mais que de repente, quando surpreendemente alguém descobre a persistência de um tabu (Nossa! mas não tínhamos derrubados todos???), no dia seguinte ficamos sabendo que as tais "liberdades públicas", a depender de certas "otôridades" pseudo-doutorais, não valem uma pataca furada.

Caçavam bruxas no telhado em Gotham City, já profetizava Macalé; y que las hay, hay-las, mas fica a esperança de que ninguém espere a segunda vinda dos Torquemadas.


(Ana Cristina Rivelles e Juliano Torres)